quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Miguel Torga faria hoje 102 anos

Vinha de longe o mar...
Vinha de longe, dos confins do medo...
Mas vinha azul e brando, a murmurar
Aos ouvidos da terra um cósmico segredo

E a terra ouvia, de perfil agudo,
A confidencial revelação
Que iluminava tudo
Que fora bruma na imaginação.

Era o resto do mundo que faltava
(Porque faltava mundo!).
E o agudo perfil mais se aguçava,
E o mar jurava cada vez mais fundo.

Sagres sagrou então a descoberta
Por descobrir:
As duas margens de certeza incerta
Teriam de se unir!


Miguel Torga "Portugal"



Miguel Torga é o nome literário do médico Adolfo Rocha nascido em S. Martinho de Anta, distrito de Vila Real, a 12 de Agosto do ano de 1907. Proveniente de uma família humilde, teve uma infância dura, que lhe deu a conhecer a realidade do campo, sem bucolismos, feita de árduo e contínuo trabalho. Após uma breve passagem pelo seminário de Lamego, emigrou com 13 anos para o Brasil, onde durante cinco anos trabalhou na fazenda de um tio em Minas Gerais.
Regressou a Portugal em 1925, concluiu o ensino liceal e frequentou em Coimbra o curso de Medicina, que terminou em 1933. Exerceu a profissão de médico em São Martinho de Anta e noutras localidades do país, fixando-se definitivamente em Coimbra, como otorrinolaringologista, em 1941.
Miguel Torga, tinha uma personalidade literária marcada pela individualidade veemente e intransigente, o que o manteve afastado durante toda a vida, das escolas literárias e mesmo do contacto com os círculos culturais do meio português. Não se inibe de fazer duras críticas desde que as sinta como verdadeiras. Para Torga o título d’Os Lusíadasrepresenta a expressão da nossa tacanhez e os versos, considerava ele, eram mais ilegíveis do que os da Divina Comédia.
A esta intensa consciência individual aliou-se, no entanto, uma profunda afirmação da sua pertença à natureza humana, com que se solidariza na oposição a todas as forças que oprimam a energia viva e a dignidade do homem, sejam elas as tiranias políticas ou o próprio Deus. Miguel Torga era por muitos considerado um homem arrogante, expunha a sua verdade sem quaisquer restrições na apreciação de pessoas, acontecimentos e factos; nunca receou atacar o estabelecido ao mesmo tempo que não punha de lado conceitos conservadores em que acreditava:
Torga alterava até as suas próprias posições desde que a "sua" verdade assim o exigisse. Era igualmente um homem obcecado pela ideia da morte e da solidão e afirmava-o de forma inequívoca.
A vivência dos sofrimentos da emigração e da vida rural, do contacto com as misérias e com a morte, fez de Miguel Torga o poeta do mundo rural, das forças telúricas e ancestrais. A revolta contra todas as leis que aprisionam o instinto humano é a grande missão do poeta, que se afirma tanto na violência com que acusa a tirania divina com a terrestre. Essa revolta, está patente na sua obra que, embora recheada de simbologia bíblica, se encontra imersa num sentido divino que transfigura a natureza, e dignifica o homem no seu desafio ou no seu desprezo, face ao divino.
A ligação de Torga a Portugal, à própria Península Ibérica e às suas gentes, é uma constante dos seus textos mas, Trás-os-Montes, é o seu grande amor e surge a cada momento na sua prosa, o pseudónimo de Torga não escolhido por acaso: Torga, ou urze, planta bravia, humilde, espontânea e com o seu habitat no chão agreste por todo o Portugal, mas particularmente nas serranias do norte.
Miguel Torga tornou-se um exímio conhecedor de Portugal, conhecimento este, que ele alargou também a Espanha, países por ele considerados unidos no conceito de uma Ibéria comum. Este conceito tinha por base a rudeza e pobreza dos seus meios naturais, pelo movimento de expansão e opressões da história, e por certas características humanas definidoras da sua personalidade. A intervenção cívica de Miguel Torga, na oposição ao Estado Novo e na denúncia dos crimes da guerra civil espanhola e de Franco, valeu-lhe a apreensão de algumas das suas obras pela censura e, mesmo, a prisão pela polícia política portuguesa.
O 25 de Abril, a par do sentido de libertação traz-lhe algumas desilusões - as perseguições, a procura de lugares.
A política é para eles (os políticos) uma promoção e, para mim, uma aflição.
Sobre a regionalização, pergunta:
O mundo a braços com o drama das diversidades e nós, que há oitocentos anos temos a unidade nacional no território, na língua, nos costumes e na religião, vamos desmioladamente destruí-la?
Não apoia nem tem a mínima simpatia pela União Europeia. Ela ofende o seu espirito patriótico e o seu ideal de Pátria.
É o repúdio de um poeta português pela irresponsabilidade com que meia dúzia de contabilistas lhe alienaram a soberania (...) e Maastricht há-de ser uma nódoa indelével na memória da Europa.
Miguel Torga morre em 17 de Janeiro de 1995 e foi sepultado onde nasceu juntamente com os pais e irmãs.
( extraído da net )

15 comentários:

José Lopes disse...

Torga, sempre Torga e sempre a sensibilidade realista do médico que era.
A música fica a tocar mais um bocado, até ao jantar.
Cumps

Anónimo disse...

Querida,sem vergonha te volto a dizer que aprendi a Amar Miguel Torga.Que bom que foi aprender com
com a minha irmã Guida,
Sem zangas.Sem berros,como irmã...
Boa noite e q. bom o trazeres até
aqui.

João Roque disse...

Era acima de tudo, um homem vertical!
Beijinho.

Graça Pires disse...

Miguel Torga para sempre!
Beijos.

Lilá(s) disse...

E 102 anos depois, ainda Miguel Torga! homenagem merecida.
Bjs

Elvira Carvalho disse...

Eu confesso que até há bem pouco tempo desconhecia Torga. Não na totalidade, é claro que de nome e saber quem era eu sabia. Mas a sua obra eu desconhecia, nunca tinha lido nenhum livro dele. Aqui na blogosfera, eu conheci o Vicente e ele me ensinou a conhecer e a gostar de Torga. Porque ele adora Torga, e porque nunca conheci ninguém capaz de falar de um poeta como ele o fazia. Um dia o Vicente desapareceu, e durante um ano não deu notícias. Há meses voltou e há dois meses desapareceu de novo. E porque eu sou uma pessoa de afectos não consigo lembrar um sem o outro...
Um abraço e tudo de bom

Fá menor disse...

... e o mar que me chama...

Foi bom saborear este poema de Torga...

Bela homenagem!

Obrigada pelas palavrinhas no meu sítio, amiga!

Bjinhos

Fa

Ana Echabe disse...

A critica pura da ausência, ação do pensamento. Sobre domínio de uma minoria, a massa é calada.
Já havia lido alguns poemas de Torga, sim poucos, mas todos intensos, o que me encanta. Confesso que desconhecia sua trajetória, o que foi muito gratificante encontrá-la por aqui.
Parabéns por mais esta bela atitude, e obrigada por mais este momento enriquecedor, meu espírito agradece.
Um final de semana cheio de sol em si.
Abraços fraternos.

vieira calado disse...

Grande Poeta!

E os seus contos?

Fabulosos!


Bjs

Manuel Veiga disse...

esta a minha Língua! Portuguesa...

Mátria!

beijo

o escriba disse...

Isamar

Como gostei de vir aqui e relembrar o grande Torga!

bjinhos
Esperança

gaivota disse...

miguel torga também foi um dos apaixonados daqui da nossa praia...
foi uma presença nestes ares, nesta maresia, conversava com o povo do mar, era um Senhor!
linda homenagem, minha querida, num dos seus lindos poemas!
bem-hajas, isabel
beijinhosssssssssss milessssssssss
como sempre!

Andradarte disse...

Sempre gostei por particulares razões,
da música do Zeca.
Acontece que eu não sei pôr música no Blog. Se a Isabel não levar a mal
o meu abuso, pedia-lhe se me podia enviar o código dessas músicas que
aí tem do Zeca.
andradarte@gmail.com
Já pedi...desculpe
Beijo

jo ra tone disse...

Depois de algum tempo aqui estou.
Nada melhor que poemas sobre o mar, para eu continuar por mais tempo com as suas imagens na minha cabeça.

Beijinhos

jo ra tone disse...
Este comentário foi removido pelo autor.