Nascida a 6 de Novembro de 1919, faria hoje 95 anos se cá estivesse. É certo que todos ficámos mais pobres com a sua partida mas deixou-nos a sua obra. Riquíssima obra! Quer em verso, quer em prosa, ela faz as delícias de todos nós. Os seus contos para a infância são lindíssimos , os seus poemas fascinam-nos. Mas há mais. Muito mais! O espólio de Sophia de Mello Breyner Andresen foi doado pela família da escritora à Biblioteca
Nacional, em Lisboa e é lá que está à disposição dos leitores..
Maria Andresen, filha da poeta, descreveu o
espólio, dizendo que são cartas, cadernos com alguns dos primeiros
esboços de poemas, agendas, diários, desenhos e recortes de jornais.
O material esteve guardado no Centro Nacional de Cultura, onde foi analisado pela filha de Sophia e Manuela Vasconcelos.
Excerto de um texto recentemente recuperado:
"Comecei
a escrever numa noite de Primavera, uma incrível noite de vento leste e
Junho. Nela o fervor do universo transbordava e eu não podia reter,
cercar, conter – nem podia desfazer-me em noite, fundir-me na noite.
No
gume da perfeição, no imenso halo de luz azul e transparente, no rouco
da treva, na quasi palavra de murmúrio da brisa entre as folhas, no íman
da lua, no insondável perfume das rosas, havia algo de pungente, algo
de alarme.
Como sempre a noite de vento leste misturava extasi e pânico."
O poema referido está intitulado «Primeira noite de Verão». No fim da folha, à direita, está a indicação «Porto, 9-V-1934».
O poema
O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sozinha
Entre as mãos de quem lê
O poema alguém o dirá
Às searas
Sua passagem se confundirá
Com o rumor do mar com o passar do vento
O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento
No ar claro nas tardes transparentes
Suas sílabas redondas
(Ó antigas ó longas
Eternas tardes lisas)
Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas
E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo
Sophia de Mello Breyner Andresen